top of page

exprime o antagonismo dentro de cada ser humano. Cida afirma: “Rio e também posso chorar”. No segundo momento, uma pausa para aquele resto de esperança nos humanos: “Com tempo ruim, todo mundo também dá bom dia”. Cida primeiro nos invade com melancolia e depois nos faz acreditar numa certa possibilidade de redenção. São apenas as primeiras facetas dessa dama mais do que digna.

Passando as primeiras impressões, Cida Moreira vem na maior cara de pau falar do amor de alma e todas as suas fases, sentidos e porções. O nome da faixa já diz isso: “Soul love” (David Bowie). Cida narra o amor sobre uma perspectiva certa e incerta, objetiva e subjetiva. A voz reforça isso ainda mais.

“Maior que o meu amor” (Renato Barros) retrata uma pessoa confusa. Que lamenta perder quem ama. Mas que afirma que se essa pessoa voltar, dirá sorrindo que o seu amor não lhe serve mais. E ela alega sentir saudade da outra pessoa. Essa é uma faixa como a voz da Cida Moreira e as letras que ela escolhe cantar: confunde, desperta, dá raiva. Só não dá para passar imune.

 

Após três músicas aparentemente díspares, Cida interpreta Lulllaby (Tom Waits). Nessa canção, ela acaba dando um pequeno recado para quem tem apreço exagerado pelas coisas materiais: “Nothing’s ever yours to keep, close your eyes; go to sleep (Nada é sempre seu para manter, feche seus olhos, vá dormir)”. Para bom entendedor...



Cida prossegue com uma letra de um Caetano Veloso visivelmente inspirado (pra variar). “Mãe” fala sobre um rei que não tem fim, que não se sente amado, que é infeliz, quase um bicho triste que nunca consegue chegar até a mulher que ama. A interpretação faz passar um filme na cabeça do ouvinte.

 

Agora é a vez da faixa seis, “Uma canção desnaturada” (Chico Buarque). Numa letra longa, Cida Moreira faz dessa um curta-metragem sobre a relação de um homem e sua “curuminha”. São fatos, impressões e conclusões da parte masculina do casal. A impressão que fica é que toda vez que canta, Cida traz histórias do mundo das composições que se assemelham as nossas próprias histórias de vida.



Chegando a metade do disco, Cida Moreira apresenta sua versão totalmente pessoal e passional de “The man i love” (Ira Gershwin e George Gershwin). É um convite a coragem.

 

A faixa oito é de autoria do Toquinho e Gianfrancesco Guarnieri. Chama-se “Sou assim”. Fala de uma mulher desiludida, desacredita. Que após várias quedas, cospe na cara da sociedade e afirma com veemência: “Sou assim, não me envergonho”. Essa mesma mulher, endurecida pelos problemas, acredita que mais vale renda certa do que suspiros de amor. Para terminar de esmagar nosso coração, Cida canta séria: “Quem chora por amor é um imbecil. Quem vive de ilusão é muito mais”.



Com o ouvinte ainda em estado de recuperação, numa espécie de UTI, Cida canta “Tango til  they’re sore (Tom Waits). A letra quilométrica assusta, porém, quem escuta o disco sente o tempo passar da melhor maneira possível.

 

E não é que o Caetano resolveu aparecer de novo? “O ciúme” é a faixa dez. Aqui, a ação do ciúme pode ser definida como o lançamento de uma flecha preta que se vê ferindo justo na garganta. Como nem as melhores palavras do mundo podem explicar direito às canções do Caetano Veloso, você pode escutar essa faixa e sentir na pele esse senhor chamado ciúme. A Cida não fala bem dele. Nem a voz dela. Muitos menos o Caetano.



Pra relaxar, na medida do possível, uma música curtinha e uma vinheta compõem as faixas 11 e 12. “Youkali-tango” (Roger Fernay e Kurt Weill), pra aliviar mesmo e “Summertime” (Du Bose Heyward e George Gershwin), imortalizada na voz da não menos visceral Janis Joplin. Nessa última, em poucos segundos, Cida nos mostra que é capaz de se apropriar de um som associado imediatamente a Janis Joplin, que deve estar sorrindo no céu sabendo que alguém que sabe cantar uma música sua.

 

O clímax, a euforia completa, o gozo dos gozos: “Back to black ”(Amy Winehouse). Isso mesmo. Numa interpretação bêbada, sofrida, intensa, Cida Moreira chega a nos fazer pensar que essa música pertence a ela. Canta com propriedade. Com astúcia. A sensação, para quem ouve, é de incômodo. Mas é um incômodo bom, mesmo que doloroso.



O encerramento, depois de 13 músicas dilacerando os ouvidos, é com uma versão (formato de vinheta) de “Lost in the stars” (Mawwell Anderson e Kurt Weill) feita pelo Antônio Carlos Brunet. Diz assim: “Antes de Deus criar terra e mar, ele segurava as estrelas na mão, que giravam em seus dedos, como areia em grão. Até que um dia uma caiu”. Realmente, uma dessas estrelas caiu. E se chama Cida Moreira. Desde que ela caiu na terra, quem a vê, quem a ouve, nunca mais esquece. Modifica-se. Enobrece.

 

 

Cida Moreira é uma pessoa estranha. Uma cantora que dá medo. Uma voz que tem a potência de um trovão. Só que esse trovão cai nos nossos ouvidos. E é tão bom. Incomoda mas agrada. Uma dubiedade, como a voz dela. E nos provoca.

“A dama indigna” é o seu último disco. Vendo as faixas, soa estranho estar num mesmo disco compositores que vão de Gonzaguinha a Amy Winehouse, passando por Tom Waits, chegando à Bahia de Caetano Veloso, encostando-se a um Chico Buarque palpitando emoções, e o resto... O resto você encontra quando fizer a audição do disco. Garanto que é gostoso, vibrante e quente.



A primeira faixa é composta por duas músicas. “Hotel das estrelas” (Jards Macalé e Duda) e “Palavras” (Gonzaguinha). A primeira 

Deixe o seu comentário:

Cida Moreira - A dama indigna

1 - Hotel das estrelas

2 - Soul Love

3 - Maior que o meu amor

4 - Lullaby

5 - Mãe

6 - Uma canção desnaturada

7 - The man I Love

8 - Sou assim

9 - Tango 'Till They're Sore

10 - Youkali-Tango

11 - O Ciúme

12 - Summertive

13 - Back to Black

14 - Lost in the stars

Escute o disco na integra

bottom of page