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Emília Monteiro

"Cheia de Graça" - lançado em 30 de julho de 2013 no Clube do Choro de Brasília, com participação do ícone paraense Dona Onete - poderia ser o nome de guerra de Emília Monteiro. Escutando este disco, o ouvinte é conduzido em viagem sonora que privilegia a musicalidade nortista. Prato cheio e saboroso para quem quer fugir do óbvio, made in eixo Rio-SP.
 
Artista que nasceu em Minas, viveu no Amapá e está radicada em Brasília, Emília é hábil na costura de sons que, embora com características regionais, pulsam de forma global. Fato comprovado por "Veneno de Cobra", faixa que ganhará clipe com previsão de lançamento para depois da Copa.
 
Aproveitando esse momento de divulgação de seu primeiro disco, a artista reflete sobre suas raízes, a importância do 

público gay como fatia consumidora, a rica sonoridade que vem do Amapá e os obstáculos que os artistas residentes em Brasília enfrentam pra fazer música. Confira:

Muitos acreditam (tanto a imprensa quanto uma parte do público) que o boom da música paraense em âmbito nacional não passa de uma garoa passageira. O que achas desse descobrimento da música feita no norte do país?
 
Eu acho que essa visão é limitada... Marabaixo, Batuque, Carimbó, Carimbó Chamegado, Lundu, Cacicó, são ritmos tão brasileiros quanto o Samba e o Maracatu... A gente consome tanto o que vem de fora do país, não é? Acredito que está na hora de nos orgulharmos de sermos brasileiros na sua integralidade, incorporando e difundindo os ritmos que constroem a nossa cultura de uma maneira mais abrangente. Discordo dessa afirmação e digo que os ritmos do Norte estão apenas começando a serem conhecidos, que merecem e devem permanecer no cenário da Música Popular Brasileira em lugar cativo e na primeira fila!!!
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
João Ferreira fez a produção musical de "Cheia de Graça", como você avalia a participação dele? Como e por qual motivo ele ficou responsável por isso?
 
Ah, João Ferreira é um capítulo à parte nesse trabalho... Eu conheci o trabalho dele porque ele produziu lindamente o CD da minha amiga Lu Oliveira. AMEI!!!  Na época, em 2008, o meu CD era apenas uma grande vontade do meu coração. Aí eu o convidei, ele topou e em 2013 o disco finalmente aconteceu. Tenho certeza de que acertei na mosca intuitivamente... João tem uma visão antenada, técnica, universal e ao mesmo tempo brasileiríssima e contemporânea na sua concepção musical.
 
Dona Onete, artista emblemática do Estado do Pará, participa duplamente de "Cheia de Graça", o que te atrai nela e como você a conheceu?
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dona Onete foi o maior presente em forma de gente que a música poderia ter me dado... A conheci quando, ainda em busca de repertório pro CD, me deparei com ela cantando Moreno Morenado na internet...  Nossa!!! Fiquei completamente apaixonada pelo carisma, pela música, pela energia, pelo talento dela... Enfim!! O Universo conspirou a favor e hoje ela é minha madrinha musical, participou do lançamento do CD em Brasília e em Belém, e somos grandes amigas, Graças a Deus!! Aliás, estamos prestes a lançar o clipe “Veneno de Cobra”, com participação da Dona Onete, direção de Mari Mira e Mauricio Chades, uma galera parceira  de Brasília. Tá ficando lindo!!!
 
Como é levar uma carreira artística estando em Brasília? A cidade te oferece os recursos necessários pra isso? Em algum momento você pensa em tentar o seu lugar ao sol em SP ou Rio?
 
Brasília tem suas limitações de espaço principalmente, mas tem muita gente querendo e fazendo arte, mesmo que na resistência por aqui. O ideal seria que eu não tivesse que sair daqui, mas não descarto a possibilidade de ir pra Sampa um dia... Se for da vontade do “Deustino”, estou aberta pra que aconteça!
 
A função de todo interprete é viver as canções de lavra alheia como se tivessem sido feitas por eles mesmos. Você canta de maneira bem pessoal as músicas de “Cheia de Graça”, mesmo que elas não tenham sido criadas por você. Então, por esse ângulo você se sente compositora?
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Nossa, você disse tudo, isso é ser intérprete!!  Não me atreveria a dizer que sim, mas nesse ponto de vista posso dizer que exerço a “liberdade poética” nas minhas interpretações.
Você nasceu em Poços de Caldas (MG). Viveu no Amapá e está a 35 anos radicada em Brasília. De que forma essa mistura de vivências influenciou o processo de feitura do disco "Cheia de Graça"? 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
De todas as formas...  O Amapá é a minha ancestralidade, o que culturalmente me define, a fonte. De lá herdei de minha mãe o amor à cultura, ao lugar, à música, o respeito e a admiração pela contribuição africana e indígena trazida na gastronomia e rituais, além de que é onde sempre fui passar as férias para ver avós, tios e primos. Macapá e Belém são referências afetivas da minha infância. Aí vem Brasília, onde cresci, junto com a própria cidade... Já comi muita terra vermelha, vivi a geração Rock dos anos 80 de Brasília, ouvindo também, por influência de meu pai, Clara Nunes, Elis, Maria Bethânia, Gal, Elza. Brasília é onde tive minhas filhas e onde tenho grandes e eternos amigos. Acredito que essas influências de alguma maneira se traduzem na linguagem final do “Cheia de Graça”, que é um disco que traz influências regionais, mas com arranjos contemporâneos, de linguagem universal.
 
Desde o surgimento de Marisa Monte em 1989 com o disco "MM", a palavra ecletismo foi ganhando conotação errada, caindo na vala comum de quem atira pra todo lado, em muitos casos. O repertório do seu disco de estreia é bem plural, abarca Macapá, Pará, Distrito Federal, Rio e São Paulo. Teve medo ou receio de parecer eclética demais?
 
Não. Na realidade, a minha maior preocupação foi a de gravar músicas que me tocassem a alma, que me dessem vontade de cantar. O parâmetro foi a mensagem que cada uma tinha pra passar, e que traduzisse a minha própria verdade, porque sou intérprete.  Acredito que o arranjo feito para as canções desses compositores de tantos lugares diferentes, soa uníssono nesse CD. João Ferreira e Rodrigo Campelo (em duas faixas) conseguiram este feito. O trabalho privilegia a percussão e os ritmos. Os temas das canções também dialogam entre si... A colonização brasileira se manifesta de maneira própria em cada região, mas tem uma mesma raiz. O Brasil tem muito mais em comum do que o contrário...
 
Nossa pergunta clássica: cantora sem fã gay a carreira não decola, procede?
 
Mas é claro que procede!!!! Kkkkkkkk. Sem meus amigos gays esse CD não teria tido a reverberação que teve até agora, nem o reconhecimento...  A sensibilidade e o conhecimento de artes de um modo geral, a veia crítica certeira em relação ao que se produz musicalmente, e a paixão com que se envolvem quando gostam de um trabalho, são alguns dos atributos em comum de meus amigos gays. O CD inclusive foi o responsável por eu ter angariado muitos amigos, muitos deles gays!!! Adooorooo!!!!
 
Vivemos numa época onde o eixo Rio-SP continua monopolizando o Brasil em termos culturais, seja no sentido de importar ou exportar artistas. Por qual motivo a música do Amapá não é tão conhecida? É mesmo difícil ter acesso a ela? Qual nome de lá você indica?
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
É verdade, mas isso já está mudando!!  A internet está quebrando de maneira definitiva esse monopólio, democratizando o acesso de um cenário que está em ebulição em Macapá. A música do Amapá ainda não é tão conhecida porque ainda não teve a real oportunidade de se manifestar nacionalmente, mas é muito conhecida  e cultuada em Macapá.  Muitas rádios online difundem nossa cultura, quer um exemplo? A Rádio Universitária, da Universidade Federal do Amapá:  http://www2.unifap.br/radiotveditora/radio-universitaria-fm-969. Temos também um grande festival, o Quebramar, que levou ano passado o Emicida e o Arnaldo Antunes pra lá. Do Amapá eu não poderia dar apenas uma indicação... Temos por exemplo, compositores maravilhosos, como Val Milhomem, Joãozinho Gomes, Amadeu Cavalcanti, Osmar Junior, Zé Miguel... Além de intérpretes incríveis também como Brenda Melo, Taty Taylor, Ana Martel, Silmara Lobato, Patricia Bastos, Hanna Paulino, entre outras...  Amapá é solo fértil pra quem se aventurar em conhecer sua cultura e seus talentos!!!

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