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Mirianês Zabot

No balaio de novas cantoras que surgem todos os dias no Brasil torna-se tarefa ingrata saber quem, de fato, ganhará lugar cativo nos ouvidos alheios. A cantora e compositora gaúcha de Ciríaco Mirianês Zabot pode bater no peito e dizer: "elas passarão, eu passarinho".
 
Em 2009 Mirianês lançou o seu primeiro disco, "Mosaico Foto-Prosaico", apesar do nome prolixo, não nos enganemos: a moça é artista objetiva e decidida, o que podemos comprovar pela produção fonográfica e musical impecável de Itamar Collaço, junto a coprodução da própria artista. Como se não fosse suficiente, o trio que a acompanha no álbum fecha o pacote: bateria e arranjos de Percio Sapia, piano, arranjo e cordas de Marinho Boffa e contrabaixo e arranjos do já citado Itamar. Juntos defendem 11 canções de lavras alheias, seja de compositores conterrâneos ou de medalhões 
consagrados. E a faceta de compositora? "Tenho apresentado composições minhas em shows, e algumas delas estarão no repertório do próximo CD. No momento não tenha pretensão de gravar um disco só com músicas próprias".
 
Complementando a estreia fonográfica personalíssima, Mirianês fez show realizado no Auditório do Instituto de Artes da Unicamp em São Paulo no dia cinco de outubro de 2008, show esse gravado e que gerou DVD lançado em 2009 junto ao disco. No espetáculo, registrou para a posteridade seis músicas gravadas no CD acompanhada de seus três fiéis cavaleiros. Analisando-o hoje, Mirianês é enfática: "Sem dúvida foi um dia de muito trabalho, assim como também o foram os dias de pré e pós-produção desse DVD.  Mas o resultado foi muito bom, acredito que tem muita emoção e vida registrados ali".
 
Na entrevista a seguir, Mirianês relembra o tempo na cidade natal, conta histórias de amigos que viraram parceiros de labuta, explica o processo de feitura do primeiro disco e destrincha a carreira com a verdade que lhe é peculiar. Confira:
Até completar 14 anos, você viveu no distrito de São João Bosco (pouco mais de 50 casas), que se localiza no interior de Círiaco, numa propriedade rural onde os seus pais moram até hoje. Musicalmente falando, o que você recorda dessa época? O que seus pais ou vizinhos escutavam? E você: o que conhecias de música?
 
Meus pais atualmente moram no município de São Domingos do Sul/RS, onde morei dos 14 aos 17 anos.  Eu ouvi e cantei diversos estilos musicais, trabalhei em bandas de vários gêneros, com as quais aprendi muito a respeito de vida e arte. Já há alguns anos me dedico a Música Popular Brasileira, por ser a que realmente me arrebatou e muito me encanta.
 
Minha mãe conta que quando eu era bebê ela costumava deixar o rádio ligado para eu não chorar enquanto ela fazia os serviços da casa.  Bem, provavelmente eu era uma boa ouvinte, rsrs!!
 
Além disso, na minha casa sempre existiram instrumentos musicais, porque meus dois irmãos tocavam amadoramente. Eles, por serem mais velhos que eu, já não moravam mais conosco, mas os instrumentos ficavam por lá, e quando eles vinham passar uns dias em casa iam me ensinando a tocar algumas músicas. Posteriormente tive a oportunidade de estudar música com alguns professores.
 
Toninho Spessoto (in memoriam), além de grande jornalista e fomentador de cultura no Brasil, era um de seus grandes admiradores. O que se comprova pelos seus inúmeros comentários a respeito do seu trabalho. Como era a relação de vocês? Como ele conheceu o seu trabalho e o que ele representa na sua carreira?
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Eu não lembro exatamente a ordem em que as coisas acontecerem, mas o fato é que Toninho Spessoto conheceu meu trabalho e depois disso convidou-me para dar entrevista nos programas que apresentava na época. Eu tive ainda a honra de ser presenteada com um release e uma resenha a respeito do meu CD, feitas por ele. E em meio a isso, Toninho tornou-se um grande amigo.
 
Além de notável conhecedor de música e cultura, Toninho era muito generoso e tinha gosto por agregar pessoas, por causa dele conheci vários outros artistas e fiz bons amigos. Sou muito grata por ter podido conviver com ele.
 
O título do seu primeiro disco é “Mosaico Foto-Prosaico”. Não é um nome comum. Desperta a imaginação, nos fazendo pensar no que seria e o que significa. Afinal, o que é um “Mosaico Foto-Prosaico” e por qual motivo você batizou o seu debute fonográfico com esse nome?
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O nome do CD Mosaico Foto-Prosaico vem da canção de New e Luis Mauro Vianna, chamada Mosaico Foto-Prosaico de Nª Srª Aparecida.  Essa música me foi apresentada pelo também compositor Otávio Segala, quando a ouvi pela primeira vez já fiquei encantada com a grandiosidade de seu texto, melodia e harmonia.
 
Toninho Spessoto, no release feito para o CD, definiu esta música de uma forma muito bonita, “A valsa-quase-oração Mosaico Foto-Prosaico de Nsa. Sra. Aparecida, com seus sinuosos caminhos líricos e harmônicos, é uma ode à canção interpretada com emoção por Mirianês Zabot. ”
O nome sintetizou realmente o que é esse disco, o Mosaico Foto-Prosaico que é uma colagem de tudo aquilo que somos. É vida, música e arte em movimento. Que se fundem e transformam-se a cada dia.
 
“Mosaico Foto-Prosaico” foi lançado em 2009. Quatro anos se passaram. Nessa era em que vivemos, com a efemeridade das coisas e esquecimento rápido, como você o vê hoje em dia? Qual análise você faz desse seu primeiro disco?
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Eu valorizo muito a história que vamos construindo em nossas vidas, e esse CD/DVD é um registro de um desses momentos, então isso por si já tem um grande valor.  Penso que uma carreira é pautada também por sua continuidade, que seja esse, portanto, o primeiro disco de muitos que hão de vir.
 
O projeto do seu primeiro álbum se iniciou em Passo Fundo com uma gravação demo. Logo depois, você se mudou para a capital paulista. Era inviável para você concluir o seu primeiro disco em Passo Fundo? Foi isso que a levou a sair de lá?
 
Aqui em São Paulo, cada vertente musical e cultural compreende um número bem maior de pessoas, por tratar-se de uma grande metrópole, logo se tem um grupo maior com objetivos parecidos. Por ser uma cidade que historicamente tem a característica de receber pessoas de todos os lugares do mundo, há por isso uma possibilidade muito grande de troca de experiências e vivências, o que é muito enriquecedor para o fortalecimento do nosso próprio trabalho.
 
Itamar Collaço fez a produção fonográfica e musical do seu debute. Como você chegou até ele? Qual a importância/contribuição dele nesse disco?
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Em 2006, logo que me mudei para São Paulo, fui apresentada pelo baixista Nilton Wood ao Itamar Collaço (ex-baixista do Zimbo Trio, professor da Universidade Livre de Música, endorser, além de já ter acompanhado grandes artistas de porte internacional), ele prontamente, após conhecer o repertório, conceito e o meu trabalho como cantora, aceitou produzir comigo o disco e convidou os músicos para gravá-lo, Marinho Boffá (pianista e arranjador que acompanhou grandes nomes da música) e Percio Sapia (atual baterista do Zimbo Trio). Esses músicos são respeitadíssimos no meio musical, pessoas de um talento e generosidade ímpares, ter a oportunidade de um primeiro disco gravado com eles é uma dádiva e uma escola.
 
No seu álbum constam composições de compositores gaúchos como Jerônimo Jardim, Caetano Silveira e Alegre Côrrea. Cantar “gente da sua terra” é uma forma de lembrar-se de onde veio e de valorizar o lugar ao qual você pertence?
 
As canções dos compositores gaúchos fazem parte do repertório do CD e do DVD porque de alguma forma elas me tocam e me emocionam, a escolha por elas não se deu por causa do endereço dos compositores e sim por serem boas canções.
 
O Rio Grande do Sul é o local de onde vieram minhas primeiras referências, lá me alicercei como pessoa e como artista.  E isso estará em mim independente de onde eu esteja ou mesmo de quais canções eu cante.
Itamar Collaço (contrabaixo e arranjos), Percio Sapia (bateria e arranjos) e Marinho Boffa (piano, arranjos e cordas) a acompanham no “Mosaico”. Essa estrutura minimalista foi proposital ou coincidência? Você é adepta, em termos musicais, do “menos é mais”?
 
Tanto se pode obter belas roupagens com pouco, quanto com muitos instrumentos, eu acredito que não exista fórmula, algumas vezes o “menos é mais”, mas se mal usado o “menos será realmente menos”.  Acredito no bom gosto de um arranjo, que este vista de forma sincera e adequada as canções.  Foi o que buscamos no Mosaico Foto-Prosaico, pensar no arranjo para as canções, dentro da proposta de um trio e uma cantora.
 
Noto uma coisa curiosa no seu trabalho: tanto nas fotos do encarte do disco como no DVD, o figurino não é apenas um adereço ou uma alegoria. Ele tem sentido de ser como é e estar ali. Como você pensa essa questão no seu trabalho?
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O figurino do CD, DVD e Show Mosaico Foto-Prosaico é de Deise Cristina Meneguzzi (jornalista e cantora). Deise é uma grande amiga que acompanha meu processo artístico-musical já há muitos anos, porém mesmo assim ela fez questão, quando a convidei para criar este figurino, de ouvir tudo o que já estava gravado, isso facilitou o entendimento da obra que estava sendo traduzida naquele disco, e assim ouve essa integração de um conceito visual com a parte musical, de arranjos, de repertório e de interpretação. Essas informações musicais contidas no disco inspiraram a figurinista a desenvolver a idéia de juntar o refinamento do cetim com o transado do trabalho rústico e manual, em cores quentes e vivas que são os tons de vermelho, laranja e amarelo. É um entrelaçar de vida e arte.
 
Ainda na concepção e criação de cada trabalho, procuro desenvolver o conceito e a essência, representados pelas sensações propostas e trocadas com o público. O conceito que é previamente definido acaba fortalecendo a relação de diálogo entre a imagem e a música. As cores, os acessórios, os movimentos e até mesmo as atitudes se propõem a atuar em favor da musicalidade. E é isso que procuro manter em meu trabalho: uma harmonia e simbiose entre os tantos elementos que o compõe.
 
A mesma dedicação, cuidado e pesquisa empregados na escolha das canções que serão apresentadas, também procuro ter com os demais elementos utilizados nos meus trabalhos. Penso que a imagem é uma ferramenta de comunicação de grande importância, afinal, não é apenas com a voz que as demais pessoas acabam se identificando e gostando do trabalho dos artistas. As fotos, figurinos, iluminação, cores, postura, cenário e outros tantos elementos, são complementos da informação poético-musical, portanto, importante que sejam desenvolvidos, criados, manejados e utilizados com finalidade.
Logo depois do lançamento do “Mosaico”, você realizou um show na Unicamp que deu origem ao DVD de mesmo nome e que foi produzido e dirigido por  Bárbara Crepaldi, Liene Saddi e Verena Pereira. O que a levou a lançar logo um DVD? Você sente necessidade de manifestar visualmente a sua música?
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Estar ao vivo no palco, ou seja, a hora do show propriamente dito, é algo que sempre fez parte do meu trabalho musical, o DVD é o registro de um desses momentos.
 
Você já realizou um conhecido tributo em homenagem a Elis Regina e Tom Jobim. O que esses dois cânones da música brasileira significam para você? O que a levou a criar esse tributo?
 
É um show especialmente dedicado ao compositor e maestro Tom Jobim e à intérprete Elis Regina, por sua tamanha relevância na construção da cultura nacional. É para homenagear, relembrar e emocionar-se com o belo legado desses que representam um marco importante nos rumos da Música Popular Brasileira, e ainda tornaram essa música respeitada e aclamada além das fronteiras desse nosso país. Retratando em canções, momentos, sentimentos e inspirando mudanças no comportamento e na vida das pessoas.
 
Esse show surgiu inicialmente com o intuito de atender ao convite do produtor Bruno Oikawa, justamente porque essas canções já faziam parte do meu repertório há muito tempo e nesse momento as juntei em único show.
 
No seu disco, você canta compositores conhecidos, como Paulo Cesar Pinheiro, Paulinho Tapajós, alternando com outros menos conhecidos e também os de sua terra. Assim como esse time eclético, você personifica vários gêneros musicais no transcorrer das 11 faixas. Isso representa uma necessidade de explorar as suas nuances interpretativas? Você gosta de ser uma coisa em uma faixa e em outra algo totalmente diferente? Como se estivesse brincando com rótulos pré-estabelecidos...
 
São 11 canções que falam de temas distintos entre si, e desde a composição trazem abordagem literária e musical diferenciadas. Portanto, precisam de uma interpretação especial para cada uma delas.
 
Não se trata de necessidade pessoal e nem de gostar de ser diferente em cada faixa.  Trata-se de buscar, com muito respeito e dedicação para com as canções, a melhor forma de interpretar cada nuance do texto, cada melodia e cada arranjo. E ainda de saber que as interpretações vão ganhando novas formas com o amadurecimento da nossa relação com a música e com as músicas.
 
Eu tenho muito carinho pela música, e isso faz com que eu busque sempre melhorar a minha forma de interpretar as canções. Gosto de experimentar ao máximo o que uma palavra cantada, uma nota, ou uma célula rítmica possa dizer. Gosto de redescobrir a cada momento a música.

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